Enzimas

PARTE 1

Enzimas são os “rolamentos” em que corre toda a vida terrestre, ou, se quiser, são os pedreiros da natureza que constroem suas obras mas não fazendo parte da construção.

E mesmo assim, é muito pouco que se sabe sobre elas. Milhares de enzimas são produzidas pelas células vivas apressando suas reações químicas. Na gíria oficial são chamadas “catalisadores”.

Todo crescimento vegetal deriva de reações químicas, a partir do momento em que a planta capta a energia solar para transformá-la em energia química. Todo nascer, crescer, produzir, morrer e ser decomposto são reações químicas e cada estágio destas reações é assistido por uma enzima. A química, portanto, não é o privilégio das firmas farmacêuticas, mas é o mais antigo segredo da vida.

Um processo químico na planta que normalmente iria levar duas ou três horas na presença da enzima adequada ocorre em dois minutos. Assim, uma plantinha que seria miúda e raquítica, graças às enzimas, se torna uma planta viçosa e luxuriante.

Enzimas acompanham nosso dia a dia sem que a notemos. Fermentam nosso pão, vinho, vinagre ou chucrute, nosso leite para poder fabricar os queijos, produzem o álcool que movimenta nossos carros e a cerveja que nos refresca em dias quentes. Enzimas ajudam a produzir proteínas, óleos, vitaminas e, o que poucos sabem, ajudam na formação de antibióticos como penicilina, terramicina, estreptomicina, auromicina e outros que curam doenças. E as doenças, por sua vez, são produzidas por enzimas bacterianas.

Existem enzimas que ajudam na separação da água de estruturas orgânicas, agem na transferência de elétrons, oxidam e reduzem minerais e também o não mineral nitrogênio; agem no transporte de radicais moleculares, rompem e formam enlaces de carbono (C-C), enfim, na modificação mínima de uma substância orgânica atuam enzimas.

Mesmo assim, são desconhecidas. Normalmente se sabe que uma doença foi produzida por bactérias ou alguma fermentação foi feita por leveduras, mas como o fazem e fizeram fica à mercê de cada um. Parece suficiente que estes microrganismos estão presentes e agem, atacam, formam ou decompõem. Mas como se imagina que uma gotícula de proteína estruturada de maneira especial, e que se chama bactéria, pode agir? Não possui nem boca nem dentes, não tem tromba nem ferrão, somente seu corpinho minúsculo, que somente pode ser visto no microscópio numa ampliação de mil ou mais vezes. Nem pele possui que a envolva. Simplesmente é protegida pela tensão superficial do seu próprio ser. Como ela vive, se alimenta, age, constrói ou destrói?

O mais impressionante é que os microrganismos são programados para um campo muito restrito. Eles podem agir somente sobre uma única e muito específica substância ou substrato, uma única estrutura química. E se esta não existir, restam-lhe duas alternativas: bloquearem-se e esperarem por tempos melhores, ou morrer, uma vez que a vida de uma bactéria dura somente meia hora a duas horas.

Na imaginação de muitos, bactérias são seres racionais com vontade própria e podem resolver se atacam uma planta, animal ou homem, mas todos os microrganismos são programados para uma única atividade sobre um substrato específico, e esta programação é feita pelas enzimas.

Cada bactéria possui somente uma única enzima. Esta ela secreta quando encontrar um substrato adequado, digere-o fora do corpo, absorve a substância dissolvida e forma nela suas proteínas. Fungos possuem 2 a 3 enzimas. insetos também, possuindo um raio de ação pouco maior.

Enzima, finalmente, o que é? Esta substância milagrosa da qual depende toda vida no mundo e que a controla? Enzima, na maioria dos casos, simplesmente é uma proteína em cadeia geralmente acoplada a uma co-enzima que na maioria dos casos, é uma vitamina. Mas esta dupla ainda não funciona. Tem que ser ativada por um metal, geralmente até 4 micronutrientes. Existem metalo-enzimas que não possuem corpo protéico, e enzimas orgânicas somente formadas por uma proteína, mas sempre, sem excessão, são ativadas por um metal. Este pode ou não fazer parte da própria estrutura da enzima, MAS NENHUMA ENZIMA SEM UM ELEMENTO METAL É ATIVA.

Energia captada da luz solar e minerais formam nosso corpo. Antigamente se dizia no batismo: Lembre-se que és pó e a pó tornarás. Era a simples lembrança de que da terra tiramos nosso corpo e à terra seremos devolvidos. O código genético somente é o programa computadorizado de sua formação e desenvolvimento. MAS QUEM AS FORMOU, AS CONSTRUIU são os MINERAIS COM A AJUDA DAS ENZIMAS. Alguns minerais fazem parte de substâncias orgânicas como o nitrogênio e o enxofre, outros formam as raízes as paredes celulares como o cálcio, outros fazem parte da clorofila, desta armadilha milagrosa que capta energia solar e a transforma em energia química, como o magnésio e o ferro. Mas a maioria deles, inclusive o tão conhecido potássio bem como os micronutrientes somente agem como ativadores de enzimas, ou seja, catalisadores.

O sabor dos grãos, verduras e frutas, sua cor, aroma, suas proteínas, amidos, vitaminas, açúcares, enfim, tudo que lhes dá valor nutritivo, valor biológico, é obra de enzimas. Cada estágio de oxidação apresenta outra substância e necessita de outra enzima para continuar o processo. SE FALTAR UMA ENZIMA, O PROCESSO PÁRA e a substância que não pode mais ser transformada se acumula na planta, tornando-a suscetível à parasitas, que se aproveitam da situação. Fora disso, a planta não consegue formar as substâncias a que geneticamente seria capaz e o produto final é biologicamente deficiente, de valor inferior.

SE ADUBAMOS NOSSAS CULTURAS SOMENTE COM NPK, ou seja, nitrogênio, potássio e fósforo, não garantimos a formação de proteínas porque o enxofre que é básico para isso permanece uma incógnita e ninguém sabe dizer se o solo possui o suficiente em micronutrientes para poder formar todas as substâncias. Fornecemos um único catalisador, ou seja, ativador de enzimas, o potássio, mas não temos certeza nenhuma se existe suficiente cobalto, cádmio, níquel, zinco e outros que devem agir na formação de aminoácidos. Fornecemos fósforo mas se existir o suficiente zinco, magnésio e manganês para poder firmar o ATP (adenosina tri-fosfato), o indispensável portador de energia, não podemos confirmar. Confiamos simplesmente que a terra possui tudo em quantidade suficiente. Mas pelo super fornecimento de 3 nutrientes (NPK) se esgotam necessariamente os outros. Portanto, esta maneira de adubação não é um enriquecimento do solo mas sua rapinagem.”

PARTE 2

Enzimas são muito sensíveis. Exigem um determinado pH. Com 0,2 pontos a mais ou a menos tornam-se ineficientes. Uma calagem maciça onde se aplicam 15, 20 ou até 30 ton/ha de calcário muda radicalmente o pH e portanto desativa as enzimas do solo. Também a temperatura influi. Com o aumento de 10 graus C acima da temperatura específica duplica a taxa de atividade, de reação. Mas a partir de 56 graus C a maioria das enzimas é desativada. Em nossos campos agrícolas, pelas duas horas da tarde, a temperatura atinge normalmente 56 graus C e pode subir até 76 graus C. Mas desativar as enzimas significa matar os microrganismos que morrem simplesmente de fome e subnutrição.

A terra está repleta de microrganismos. Em cada colher de chá encontram-se 100 a 200 milhões de micróbios. Eles tornam a terra fértil, mobilizam e oxidam nutrientes, mantém a estrutura porosa do solo para que entre água e ar. Eliminam substâncias tóxicas excretadas pelas raízes para proteger seu espaço, produzem antibióticos, enfim, eles reciclam e renovam constantemente as condições da terra, favoráveis à produção. Mas o que melhora a terra não são as bactérias em si, nem seu número, mas as enzimas que excretam e que agem no solo. Por isso se fala do ‘potencial enzimático’ de um solo. E quanto maior este potencial, tanto mais produtivo o solo.

Mas quem controla as bactérias e outros microrganismos? Quem impede que invadam tudo, plantas, águas, animais e homens? Tudo na natureza é natural e genial. Seu instrumento de trabalho, as enzimas, ao mesmo tempo restringem e evitam que ajam sobre algo que não foi previsto e planejado.

E de onde vem a energia dos micro-seres? Uns a tiram da oxidação ou redução de minerais, outros vivem das excreções radiculares, do lixo metabólico das plantas; a maioria, porém, tira sua energia de matéria orgânica. A matéria orgânica portanto não é principalmente ‘adubo orgânico’ como se acreditou por muito tempo, mas ela é o alimento dos micro-seres para que, com suas enzimas, mobilizem o solo e com suas ‘geléias’ agreguem as partículas do solo para grumos, tornando-o poroso e permeável para o ar e a água.

Os micróbios morrem se faltar alimento, isto é, quando se queimam sistematicamente os restos das colheitas, a palhada, mas eles também não sobrevivem a uma mudança brusca de ph, que desativa suas enzimas e com isso impossibilita sua alimentação. Também morrem pelo aquecimento forte do solo, como em terras mantidas limpas, tanto faz se é por capina manual, mecânica ou herbicidas. A consequência da morte dos microrganismos é o adensamento superficial do solo e destruição dos grumos e poros pela chuva, porque sem vida os grumos perdem sua estabilidade contra o impacto das gotas de água. E a morte dos microrganismos se torna uma calamidade pública porque acarreta a erosão, enchentes e em seguida a seca, porque pouca água conseguiu infiltrar-se.

Enquanto se acredita que insetos e micróbios podem atacar as plantas simplesmente porque existem e porque gostam de destruir culturas, a única maneira de evitar isso é a matança. matam-se insetos em armadilhas, atrai-se com feromônios colocando-se iscas envenenadas ou pulverizando com agrotóxicos.

Mas já o famoso Pasteur disse: le microbe ne rien, le milieu c’est tout ( o micróbio é nada, o ambiente é tudo). Se as plantas não oferecerem substâncias que as enzimas dos insetos, fungos e bactérias conseguem ‘digerir’, eles simplesmente têm de ir embora ou morrem de fome. E as plantas ‘oferecem’ substâncias atacáveis, que se acumulam por falta de ativadores de suas enzimas, que deveriam ajudar na metabolização dessas substâncias. Ou, para dizê-lo mais simples, por falta de micronutrientes. Podem ter certeza: SE UMA PLANTA E´ ATACADA E´ PORQUE SEU METABOLISMO NAO FUNCIONA SATISFATORIAMENTE. Circulam substâncias na sua seiva que deveriam ter formado substâncias orgânicas como proteínas, gorduras, etc. mas que foram impedidas, por falta de enzimas.
PORTANTO, PLANTA PARASITADA É PLANTA DEFICIENTEMENTE NUTRIDA.

PARTE 3

Não é raro ouvir dizer que micronutrientes não adiantam. Isto é porque a planta faz seu programa no momento da germinação. A análise da água que penetrou orienta a programação e seu computadorzinho passa para programas alternativos. As plantas conseguem absorver os micronutrientes mas não os utilizam, porque não foi programado: faltaram no momento da programação!

Por outro lado, quantidades mínimas conseguem efeitos grandes. Umas gramas de iodo num hidropônico evitam a ferrugem em crisântemos. Traços de molibdênio pulverizado sobre as sementes de algodão o tornam mais produtivo e sadio. Nunca pode se esquecer que os micronutrientes não são nutrientes mas ativadores de enzimas e às vezes, uma enzima pode catalisar dezenas de milhares de reações químicas, como por exemplo a catalase.

Na agricultura existem diversas maneiras de adicionar micronutrientes. Se o solo tiver uma estrutura boa, com poros suficientes, consegue absorver e formar suas enzimas. Se o solo é mais gasto e cansado existem micronutrientes para adubação foliar, como óxidos silicatados ou água do mar dessalinizada.

As enzimas do solo têm controle. Principalmente pela matéria orgânica humificada que tira muitas enzimas de circulação mas que podem ser facilmente mobilizadas. Existem inibidores de enzimas, geralmente venenosos, que as desativam como enxofre, arsênico, cianetos e semelhantes. Também são controlados por outros microrganismos. Quanto mais diversificada a vida do solo, tanto melhor o controle de cada um.

Também se reduz o número de uma espécie de microrganismos pela alimentação. Assim, uma rotação de culturas impede que uma ou outra espécie prolifere. E finalmente, as enzimas dependem dos micronutrientes que as ativam.

Texto escrito por Ana Primavesi para o Guia Rural, 1992.