A deficiência de boro e molibdênio

O Boro:

Seu número de oxidação sempre é 3 – B(OH)3. O boro solúvel em água ocorre especialmente na camada superficial do solo. Os hidróxidos de ferro e alumínio e diversas argilas absorvem grandes quantidades de boro estando num pH entre 7 e 9. Em presença de matéria orgânica o boro é muito mais disponível. Suas formas mais comuns encontradas no comércio são de ácido bórico, bórax, penta e tetraborato de sódio.

Embora se saiba que a deficiência de boro é uma das mais frequentes, não se sabia exatamente o que o boro fazia na planta. Ele não é uma parte de sistemas enzimáticos nem um agente de ligação entre as enzimas e o substrato. Não é capaz de mudar sua valência para poder dirigir processos enzimáticos e mesmo assim sabe-se que boro é essencial: no metabolismo dos carboidratos, dos ácidos nucleicos, na formação de proteínas, no metabolismo do nitrogênio, sobre o desenvolvimento celular e sua diferenciação, a permeabilidade das membranas, o metabolismo em geral, o desenvolvimento das flores e a germinação dos pólens, a formação das frutas, a absorção ativa dos minerais, o regime de água dentro da planta, o metabolismo e transporte dos hormônios, etc. Mas mesmo assim, por muito tempo,  não se sabia praticamente nada sobre a função principal do boro. Sabia-se que fazia parte de alguma função no transporte dos açúcares, mas qual?

Lukashi (1999), pesquisador do USDA encontrou o segredo: o boro é indispensável na transformação de monossacarídeos, o primeiro produto fotossintetizado que não migra na planta e que permanece no lugar aonde se formou para dissacarídeos que migram da folha para a raiz. Aqui, seus grupos carboxílicos (COOH) enriquecem a seiva, nutrientes. Sem boro a raiz vive faminta e absorve quase nada.

 As raízes e o ponto vegetativo da planta não se desenvolvem. Com pouquíssimos nutrientes e água a planta não consegue se desenvolver O problema é que nossa atual pesquisa não enxerga as interrelações mas somente processos isolados. E o bobo, exatamente, é quem interliga todos os processos na planta. É quase nada e mesmo assim, é tudo.

Segundo Bergmann (1976), as plantas têm maior necessidade de boro quando formam a massa foliar e na época de floração e formação dos frutos. Monocotilédonos necessitam muito menos boro (mais ou menos de 2 a 5 ppm) do que dicolédonos (mais ou menos de 20 a 70 ppm) onde as plantas com seiva leitosa como a papoula, dente-de-leão, etc, necessitam ainda quantidades maiores (mais ou menos de 80 a 90 ppm).

A deficiência de boro é aumentada pela seca e valores altos de pH que ocorre especialmente após uma calagem corretiva em solos mais arenosos e em estufas após alguns anos de plantio. Nas análises foliares o boro sempre é maior nas pontas e margens das folhas novas e no ponto vegetativo do broto e das raízes. Nas folhas velhas isso não ocorre. Porém, conforme a organização de um ensaio e sua sequência, pode-se provocar um excesso de B nas folhas velhas e sua falta nas novas, isto é, o contrário do normal.

Os sintomas mais comuns da deficiência de Boro são:

  • Clorose nas folhas mais novas que crescem em rosetas ao redor de um broto fraco ou morto;
  • Internós curtos – que também ocorre na deficiência de K. Às vezes, é difícil de distinguir a deficiência de Boro e de Potássio;
  • Potássio facilmente falta também porque sua proporção é de K/B=35 a 50/1. Isso quer dizer que se existe somente Boro para 50 partes de K, todo o resto não reage e mesmo uma adubação com 2500 kg/ha de KCl não vai ter efeito positivo. Este depende de aplicação de suficiente Boro (proporções);
  • Morte dos brotos, engrossamento de folhas e pecíolos. Caules quebram fácil e racham. Aumento de brotos indesejados na parte baixa das árvores. Poucas flores e frutos e queda precoce de cápsulas de sementes ou frutinhos como no café;
  • Raízes pequenas e mal desenvolvidas, às vezes engrossados com pontas mortas e rosetas de radículas ao redor. Nabos, beterrabas e semelhantes podem ser descolorados (com anéis esbranquiçados) e ocos;
  • Frutas podem ser deformadas. Por exemplo as laranjas são secas (sem suco) e formam uma cortiça que racha, tendo manchas descoloradas escuras na carne (por ex. na maçã).

Embora os sintomas sejam diferentes, todos se baseiam nas mesmas alterações do tecido do solo enquanto N P,K, Ca, Mg e Mo diminuem. Em condições ácidas (abaixo de 5,6) não somente o P e o Mo desaparece, ou seja, se tornam insolúveis enquanto o Al aparece. Já em condições neutras a alcalinas (acima de 8,0), os micronutrientes desaparecem em sua maior parte (menos o Mo).

O Molibdênio

Como o cobre, não aparece tanto em silicatos mas frequentemente em sulfetos. Ele aparece em vários tipos de rochas básicas e ácidas, sendo seus valores mais baixos nos basaltos. Ele aparece principalmente em argilitos e rochas calcárias e nos sedimentos ricos em matéria orgânica. Ele normalmente aparece como ânion. Suas reações são semelhantes ao fosfato em meio ácido. Suas formas mais comuns no comércio são o molibdato de sódio e de amônio. E mais vendido no Brasil como “Frita” (fritted trace elements), o FTE.

Ele faz parte de várias enzimas, especialmente de nitrogenase (também existente em microrganismos que fixam N2 e na transformação de N2 a NH4. Sem Mo a fixação microbiana de N seria muito menor). É intimamente relacionado com o transporte de elétrons e várias reações bioquímicas. Na planta, o Mo é bastante móvel e se transloca das folhas mais velhas para as mais novas. Sua deficiência aparece primeiro nas folhas mais velhas com amarelecimento e bordas enroladas. Quando falta Mo ( nos nódulos, Mo é até 10 vezes maior do que nas folhas) a atividade de nitrogenase é muito reduzida e a fixação de N pelos rizóbios é muito baixa.

Embora seja um elemento de solos neutros a alcalinos, está sendo absorvido em forma de ânion. A quantidade que as plantas necessitam é muito baixa, geralmente entre 0,5 a 1,0 ppm. Porém, conforme a planta e o lugar onde cresce, pode subir até 5 ppm. Pode ser tomado por regra que plantas que crescem bem em solos ácidos necessitam menos do que as que gostam de ambientes neutros como leguminosas e crucíferas. Mas mesmo assim, trevo não reage mais ao Mo acima de 0,3 ppm. Monocotiledôneas (capins) normalmente não necessitam mais do que 0,1 ppm. Normalmente, as sementes são mais ricas em Mo do que a planta em si e por isso a deficiência raramente aparece em cultivos com sementes graúdas. O teor em Mo nas plantas pode oscilar até 1000 vezes sem causar danos à planta, o que, porém, é muito perigoso para animais que pastam, especialmente quando os níveis de Cu já são marginais (proporção Cu/Mo=10).

A necessidade de Mo no metabolismo do nitrogênio, especialmente para a reductase de nitratos para nitritos é conhecida desde que se observou sua necessidade na fixação de N por rizóbios e fixadores em geral, como o Azotobacter. Especialmente na formação de proteínas o Mo é indispensável. Bergmann (1959) constatou quando em plantas o teor normal de Mo na célula (3000 átomos de Mo) baixou à metade não ocorreu mais divisão celular, não se formaram mais proteínas e as células acumularam fécula. Quer dizer que se faltar Mo, ocorre a acumulação de nitratos e não se conseguem mais formar proteínas apesar de quantidades elevadas de N e que em certas hortaliças e nos pastos pode levar até à intoxicação por nitratos dos animais que pastam. A deficiência aparece mais intensa nas extremidades nas margens das folhas como mostram as fotografias Kirlian. Se faltar Mo ocorre primeiro uma redução dos aminoácidos na planta (como de glutamina e arginina) mas que depois sofrem um aumento pronunciado graças à decomposição de proteínas que ocorre.

Quando se adubam com nitratos, a necessidade de Mo é maior do que quando se usa amônia, ureia ou nitritos. Interessante é que o Mo também tem influência pronunciada no metabolismo de fósforo ajudando na inclusão de fósforo inorgânico em complexos orgânicos. Mo influi também na síntese de pectinas, ativa diversas enzimas e aumenta a atividade de alguns fermentos.

Existe uma íntima ligação entre Mo-Cu-Fe. Por exemplo: a inter-relação Fe-Cu-Mo em animais, plantas e homens é de 500-10-1. Podem ser induzidas cloroses em plantas por excesso de Cu, Zn, Co que poderiam ser completamente eliminados por Mo. Pode-se constatar que, apesar de suas quantidades mínimas necessárias, o Mo tem uma influência respeitável no metabolismo vegetal. Porém as inter-relações com cálcio e provavelmente também alguns micronutrientes como cobre não são muito bem esclarecidas. Assim, por muito tempo, acreditou-se que o “fundo preto” de tomates se devia a falta de cálcio. Mas ao mesmo tempo se constatou que o cálcio aplicado em adubação foliar não fez efeito nenhum. Ficou o enigma: por que o cálcio, neste caso, somente teve efeito quando incorporado ao solo? E ficou outro enigma: Por que a deficiência de Ca em tomateiros tinha dois sintomas diferentes?  Era falta de cálcio quando os tomates pareciam saquinhos  cheios de água e quando os frutos tinham um fundo preto. Esclareceu-se que no caso do fundo preto uma adubação foliar com Mo resolveu rapidamente o problema. Faltou Mo, porém na falta de Ca no solo, este não podia ser absorvido pela planta. E somente quando foi adubado com cálcio o Mo foi absorvido pelo tomateiro.

Do mesmo modo que o curuquerê da couve (larvinha da borboleta Ascia monuste orseis L.) não come em plantas que foram adubadas com Mo. Assim, pulverizando o repolho ou a couve-flor com Mo a borboleta some e não aparece mais, uma vez que suas larvas não poderiam mais viver nas plantas que recebem o suficiente de Mo.

A “mancha amarela” em larenjeiras, que por muito tempo era uma peste em pomares, também é somente falta de Mo. Também as saúvas que cortam folhas para preparar canteiros para seus fungos com quem nutrem suas obreiras, nunca irão cortar folhas com proteínas formadas, uma vez que nenhum microrganismo (fungos e bactérias) consegue digeri-las. Cortam somente folhas com aminoácidos formados  mas nunca com proteínas. Após a adubação com Mo (250g/ha) de uma plantação de árvores florestais, 3 meses mais tarde as saúvas não cortaram mais as folhas e mudaram para outra região. Sabe-se hoje que para a formação de proteínas a planta necessita de aminoácidos: 3 em base de nitrogênio, 1 em base de enxofre e mais o Mo como catalisador. Se uma cultura sem proteínas formadas recebe uma semana de chuva, ela amarelece. Se tinha suas proteínas formadas, ela cresce mais intensamente.

O Mo é pH dependente: quanto mais ácido o solo, tanto maior a deficiência de Mo. Mas a acidez do solo sempre é elevada em solos compactados onde também o P desaparece e o Al, Mn e Fe sobem. Em muitos casos a agregação do solo resolve a deficiência de Mo. Por outro lado, em solos compactados e ácidos, uma adubação com Mo somente faz sentido quando se usa também uma calagem, que aumenta o pH ou quando se agrega matéria orgânica ao solo, que melhora sua estrutura e que concomitantemente aumenta o pH.

Podem-se considerar “plantas indicadoras” para deficiência de Mo: todas as Brassicaceas onde a deficiência aparece com mais frequência e mais intensidade e no pasto a “leiterinha” uma árvore pequena das sapindáceas que somente aparece em maior quantidade quando faltar Mo. Em pastagens o aparecimento frequente do capim Sporobulo poiretti também e indicador de falta de Mo. Muitas vezes os sintomas da deficiência de Mo parecem-se com deficiência de nitrogênio uma vez que a formação de proteínas é impedida. Por outro lado, acumulam-se compostos nitrogenados de baixo peso molecular. Parecem muitas folhas furadas por causa de tecidos finos e fracos que facilmente caem. Quais sintomas que se desenvolveram pela deficiência de Mo depende da gravidade da deficiência, do adubo nitrogenado que foi aplicado, da idade, mas também da espécie de planta em que os sintomas aparecem, isto é, quais reações de enzimas atingidas. Mas quase sempre aparecem aparecem folhas cloróticas, com margens necrosadas e enroladas, folhas deformadas e flores muito pequenas e deformadas. O problema dos sintomas da deficiência de Mo é que parecem muitas vezes a de ferro e podem aparecer tanto nas folhas novas como nas velhas. Também uma análise química não é muito segura porque o tecido pode mostrar grandes quantidades de aminoácidos, que se tornam proteínas uma vez que a análise de proteínas é bem mais complicada, mas que não conseguem ser transformadas em proteínas por falta de Mo.

É mais seguro fazer uma adubação foliar experimental em pequena área para saber se é ou não é a deficiência em Mo. O resultado aparece em poucos dias.

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