Instrução ao agricultor: Correção da acidez do solo e sua desintoxicação pela matéria orgânica

Instrução ao agricultor: Correção da acidez do solo e sua desintoxicação pela matéria orgânica

O pH do solo é corrigido pelos microrganismos que decompõem a matéria orgânica e, como em nossos solos a maioria deles possui enzimas com máxima atividade a um pH de 5,6, este pH pode ser considerado ótimo para solos tropicais. A correção para um pH mais elevado em solo tropical não é necessária e nem vantajosa.

Muitos nutrientes tornam-se tóxicos em ambiente anaeróbico, que sempre existe em solos compactados e adensados. Assim, o ferro, o alumínio e o manganês perdem a sua toxidez quando o solo receber matéria orgânica com elevada relação C/N (não biologicamente estabilizada) que o agrega, permitindo seu arejamento ou oxigenação.

Quando a matéria orgânica é enterrada em 35 a 40 cm de profundidade, o efeito de oxigenação não ocorre, ao contrário, produzem-se mais substâncias tóxicas, como o metano e o gás sulfídrico; e a condição do solo piora para as plantas. A matéria orgânica pode recuperar um solo, tornando-o fértil e produtivo, mas esta mesma matéria orgânica também pode arruiná-lo mais ainda, se for manejado de maneira antiecológica. Ecológico é como a natureza o faz e não como o homem o imagina.

Os solos salinizam pela irrigação mal feita, pela água que sobe de um nível freático muito alto (falta de drenagem) e é acelerada pela queima do campo e pela falta de proteção da camada superficial do solo.

A matéria orgânica celulósica, como a palha de sorgo e a de milho, transforma os sais em carbonatos, que são pouco solúveis em água e, portanto, ficam imobilizados. Por outro lado, ela agrega o solo, o que dificulta a ascensão de água do subsolo (por capilaridade), mas promove sua infiltração com rapidez (lixiviação). Com isso, evita-se sua perda pelo vento e brisas, especialmente quando existe um mulch sobre o solo, que impede seu aquecimento. Além do mais, se forem plantados cultivos que diminuem o nível freático, como o sorgo e o girassol, além do estabelecimento de quebra-ventos, a salinização é controlada.

É bom estar ciente de que a desertificação e a salinização não têm combate químico-mecânico, mas somente biológico-ecológico. Portanto, não é importante procurar como colocar os nutrientes no solo (por meio de NPK, esterco, composto e outras fontes), mas como animar a vida do solo que mobiliza os nutrientes, e agrega as partículas sólidas do solo, e estabelece uma macroporosidade desejável para os cultivos (10% ou mais). O manejo do “mato” e a biodiversidade são importantes.

A matéria orgânica serve especialmente para animar e alimentar a vida do solo e não para enriquecê-lo. O fato de a matéria orgânica liberar seus nutrientes após sua completa decomposição é um brinde da natureza pelo serviço bem feito. Complementarmente, constata-se que o desenvolvimento das culturas não depende da riqueza mineral da matéria orgânica adicionada e sim de seu efeito sobre a vida do solo. Composto, como toda matéria orgânica, é alimento da microvida e, por isso, um condicionador do solo, ou seja, ele o agrega, porém com menos eficiência que as palhadas, dependendo de seu grau de estabilização biológica. Como é matéria orgânica semidecomposta, sofre ainda futura decomposição até ser transformada em calor, água, gás carbônico e minerais.

  Portanto:

• nos trópicos não pode ser enterrado até 30 ou 40 cm de profundidade, mas deve permanecer na superfície do solo ou numa camada superficial. A enxada rotativa pesada não serve para incorporar composto.

• Quando preparado com lixo orgânico urbano, cama-de-frango de granjas convencionais ou bagaço de cultivos convencionais (cana-de- -açúcar, laranja, uvas), certamente, o composto não fornecerá um sal químico, mas um material orgânico. Porém, é repleto de agrotóxicos e que, portanto, não serve para a agricultura orgânica. É orgânico, mas “impuro” e as culturas com ele adubados podem ser mais ricas em agrotóxicos do que as que recebem os agrotóxicos pulverizados via foliar.

• O composto produzido com material da própria fazenda não precisa, necessariamente, manter a saúde das culturas. Ele a mantém se as variedades forem adaptadas ao solo e ao clima da propriedade. Mas não necessita manter se forem híbridos ou variedades de outras regiões, países ou continentes, como a maioria das hortaliças.

Usam-se variedades vegetais de outras regiões, países e continentes e espera-se que o composto utilizado seria o suficiente para nutri-las bem. Normalmente, não é o suficiente porque o composto somente pode ser feito do que seus solos ou os dos seus vizinhos conseguiram produzir, tanto faz se se tratar de matéria vegetal ou estercos animais. Ele não pode fornecer o que estas variedades estranhas ao solo e ao clima local necessitam, estão adaptadas ou estão acostumadas a receber. Portanto, seu composto pode, mas não precisa ser, o suficiente para manter estas variedades com saúde.

Acredita-se também que o composto seja a única fonte de nitrogênio, além dos rizóbios das leguminosas. Isso não é correto e, geralmente, existe pouca relação entre o nitrogênio fornecido pelo composto e o nitrogênio que se encontra no solo. Qualquer material orgânico, inclusive palha, aplicado superficialmente, consegue fixar nitrogênio do ar durante sua decomposição. Assim, o que importa não é tanto o material do qual o composto é feito, mas que sua decomposição final no solo seja aeróbia, e seja realizada por bactérias aeróbicas capazes de fixar nitrogênio.

Quanto ao composto, acredita-se que seu nitrogênio nunca causará um desequilíbrio nutricional por excesso de nitrogênio e deficiência de cobre (N/Cu). Porém, qualquer nitrogênio, tanto faz se é químico ou orgânico, pode produzir um desequilíbrio. Este se verifica pelo aparecimento de folhas extremamente grandes, que muitos tomam por uma alimentação excelente, mas que, na verdade, é a deficiência de cobre “induzida” pelo excesso de nitrogênio. Portanto, mesmo com uso de composto, às vezes, é necessário acrescentar sulfato de cobre (CuSO4) na proporção de 2,5 a 3,0 kg/ha. Ou seja, se colocarem 30 t/ ha de composto estes 3 kg de CuSO4 têm de ser misturados com 30 toneladas de composto.

A compostagem não se faz mais em montes altos, como antigamente, quando estes precisavam ser revolvidos semanalmente, mas em montes bem compridos (“minhocas”) de 1,20 m de altura por 2,00 m de largura. Essa composteira não necessita ser revolvida. A fermentação e a maturação levam mais ou menos três meses. O composto de restos vegetais da propriedade rural somente vale a pena ser feito quando se tratar de material acumulado. Quando se tem que recolher, por exemplo, os restolhos ou a palha de uma cultura no campo, a “compostagem na área” é muito mais vantajosa. Neste caso, os resíduos vegetais ficam na área onde foram produzidos e, em solos pobres (de baixa fertilidade), devem ser enriquecidos com um fosfato cálcico, como o hiperfosfato, o termofosfato, a Escória de Thomas, o fosfato natural e outros.

Para plantar este campo, se a terra já estiver mais ou menos com boa agregação, pode-se passar, no dia anterior ou até no mesmo dia, uma grade niveladora, somente para revolver a palha superficialmente (fazer o contato melhor da palha com a terra). Não vai haver problema porque a decomposição (liberação de energia) se inicia por meio da atividade da micro e mesofauna do solo e a palha, quando na camada superficial em condições aeróbicas, permite a fixação assimbiótica de nitrogênio do ar.

Se o solo estiver bastante decaído, com encrostamentos superficiais e lajes subsuperficiais, após o revolvimento superficial da palha, é preciso esperar uma chuva boa (uns 20 mm ou mais) para lavar as substâncias germostáticas, que os fungos produzem ao iniciar a decomposição. O composto de uma mistura de resíduos vegetais e estercos animais precisa ter uma proporção de três partes vegetal (seco) para uma parte de esterco. Podem-se utilizar 40 t/ha de composto de esterco de bovino, mas não se aconselha a usar mais do que 20 t/ha do esterco suíno, que é muito mais rico em NPK que o esterco bovino e, facilmente, induz à de ciência em cobre, zinco, boro e outros.

Em muitos países, o lixo orgânico urbano é compostado comercialmente por grandes empresas e vendido como adubo orgânico. Não há dúvida de que seja orgânico e não um sal químico, porém, geralmente, é feito de restos vegetais ricos em resíduos tóxicos (agrotóxicos, e mesmo metais pesados de outros rejeitos agregados). Assim, por exemplo, a alface recebeu a cada dois dias a aplicação de um defensivo; a maioria das verduras, no mínimo, uma vez por semana; as frutas recebem defensivos no mínimo uma vez por semana ou até diariamente (como é o caso de uvas e moranguinhos). Estes resíduos orgânicos são, segundo Mokiti Okada, “impuros”, e as frutas orgânicas produzidas com este composto podem conter mais veneno do que as que receberam pulverizações com agrotóxicos.

Vários horticultores usam uma mistura de 100 kg de bagaço de cana acrescido de 40 kg de esterco de gado e esperam passar somente a fase de maior fermentação. Geralmente, após duas a três semanas já utilizam a mistura fermentada como cobertura morta em seus canteiros.