Transcrição de parte da entrevista com Ana Primavesi, Paulo Kageyama, Washington Novaes, Ricardo Abramovay e João Paulo Capobianco.
(somente a fala de Primavesi está transcrita)
– Não dá para conciliar agricultura e biodiversidade perfeitamente porque a agricultura sempre vai ter uma biodiversidade simplificada. Porque o que o mato apresenta, a agricultura não pode apresentar. Por outro lado, posso colher em menores áreas com mais produtividade, porque o vento baixa a produção no mínimo pela metade. Às vezes, cinco vezes mais. Posso ter 50% da área reflorestada e não terei uma grama a menos do que produzimos hoje.
– O Brasil é um país tropical com ecossistemas completamente diferentes dos europeus e utilizamos a tecnologia dos americanos de clima frio. O Uruguai já tem um clima mais moderado, menos tropical, quase temperado, por isso consegue produzir mais, não porque está melhor e sim porque (comparativamente) estamos usando uma metodologia oposta à nossa realidade.
– A base da agricultura em clima temperado é a riqueza em nutrientes; a do tropical é a riqueza e microrganismos. Estes microrganismos têm de ser nutridos, que não são mais, porque estamos colocando herbicidas desde o início para que não se produza matéria orgânica. Temos no Brasil um solo pobre ( em nutrientes) mas muito vivo. E plantamos ainda espécies que são fora de nosso clima. A mobilização de nutrientes, mesmo de Sílica, é feita por bactérias e elas e os fungos que nós tomamos hoje na maioria das vezes como patógenos vegetais não são patógenos, são mobilizadores de nutrientes. A nossa base é matéria orgânica no solo não para fornecer nutrientes mas para nutrir essa vida que vai fornecer os nutrientes.
A Revolução Verde não foi feita para produzir mais e sim para salvar a indústria química americana da falência. Nesta época, a agricultura ainda financiava a indústria, eles começaram a procurar um mercado para os produtos da indústria química americana e tiveram a ideia fabulosa de abrir a agricultura para isso. Por isso nossos estudantes e professores receberam bolsas lá na América do Norte para aprender a difundir esta entrada de químicos na agricultura.
– O problema do transgênico é o seguinte: Por exemplo, eu combato com Round Up todo amendoim bravo da soja. A soja tá limpa, (antes da pulverização) estava muito infestada. Mas o problema era que o amendoim bravo indicava a deficiência de molibdênio. Matei o mensageiro. Matei o que me dizia o que falta, mas a deficiência continua. Ou eu planto, por exemplo, milho Bt, que é o milho que está com folhas intoxicadas com proteínas tóxicas para não ser comido por nenhum lagarto. Mas o lagarto do cartucho somente apareceu em plantas deficientes em boro. O lagarto não aparece mais, mas a deficiência continua. E nós temos hoje por isso na América do Norte, nas verduras que usam mais Bt (variedade transgênica) que existe, de 20 a 24% desses Bt necessitam de agrotóxicos porque a deficiência é tão grande na vegetação que não tem mais maneira de proteger (a produção) simplesmente pelo transgênico…
– O pior é que esse alimento será fornecido para as pessoas que são super deficientes também desses elementos e que causam uma série de doenças. Por exemplo, o Voisin já ligou à falta de boro o câncer. Na América do Norte eles ligam a deficiência de cobre ao nascimento de crianças paraplégicas e sabemos que se há deficiência de zinco temos crianças débeis mentais, na China, juntaram 1400 crianças débeis mentais, deram zinco e recuperaram todas, ficaram se não mais, até muito inteligentes. O pior não é o transgênico ou não transgênico e sim a origem desse negócio que está escondendo a verdade e não resolvendo nada.
– O maior problema da destruição dos solos é a água. A agricultura é super tecnológica, a ponto de destruir os solos, que ficam impermeáveis. Quando chove, dá enchente, quando não chove os rios estão secos, as represas estão secas. Temos de nos conscientizar de que a base é a recuperação dos solos, das paisagens, para que o vento não leve a umidade.