Dos dezesseis minerais (conhecidos) que compõem o “cardápio” das culturas, o cálcio destaca-se por desempenhar outra importante função: é ele quem estabelece a seletividade de absorção das plantas. Há até quem as classifique em cálciofilas – que gostam de cálcio – e cálciófolas, que o dispensariam. A distinção, porém, é incorreta, pois parte do princípio de que o cálcio serve somente para corrigir o pH do solo (calagem). O que de fato existe são plantas que necessitam de calagem e outras que não a suportam – mas sem cálcio elas não podem viver. Dois exemplos:
- Amendoim: É exigente em manganês, mineral que é imobilizado pelo aumento do pH. Mas na falta de cálcio, o amendoim não forma bagas com sementes graúdas. Para que isso ocorra, aduba-se em cobertura com gesso, que nada mais é do que o sulfato de cálcio.
- Jabuticaba: Embora se nutra de cálcio, não o admite como corretivo porque, sob essa forma, ele mobiliza o zinco, micronutriente essencial à produção de um hormônio que acelera o crescimento vegetal.
Como se percebe, muitas plantas não gostam de calagem porque ela imobiliza alguns micronutrientes que lhe são necessários. No entanto, na ausência de cálcio, as células da raiz perdem sua semi-permeabilidade, ficam, como se diz, “furadas”, e, dessa forma, são incapazes de selecionar todos os minerais de que precisam.
Cabe assinalar a existência de plantas cujas raízes absorvem cálcio de solos onde, raramente, esse nutriente se encontra disponível. As folhas dessas plantas são muito ricas em cálcio e dispensam a calagem. Curiosamente, essa capacidade de mobilização é própria também das minhocas, formigas, milipés, cupins e outros insetos – uma dádiva da natureza que escapa à nossa compreensão.
Geralmente liga-se a necessidade de cálcio à presença de alumínio no solo. Nos trópicos, a maioria das plantas suporta bem, e até inclui em sua dieta algum alumínio para equilibrar a hidratação das raízes. Mas, caso ele ocorra, forma-se livre e em grande quantidade em solos ácidos, torna-se tóxico à raiz – estigma que injustamente carrega sozinho, pois todos os outros minerais, quando aparecem isolados no solo (em solução monossalina) são igualmente nocivos. Vale dizer: o efeito maléfico ou benéfico de um mineral não depende exclusivamente de suas propriedades químicas, mas de seu equilíbrio ou dominância em relação aos demais.
Ainda nesse campo, propaga-se outra teoria equivocada: a de colocar o calcário o mais profundo possível pela ação do arado a fim de neutralizar o alumínio. Com isso, revolve-se a terra morta até a superfície, onde, castigada pelas chuvas, encrosta. Assim, o possível benefício desse procedimento desaparece se comparado com o prejuízo resultante do adensamento do solo. Racional seria utilizar o gesso, que é mais solúvel e migra facilmente para o fundo (esse fenômeno ocorre também quando há suficiente matéria orgânica e micro vida ativa no solo).
Na verdade, muitas plantas tropicais são dotadas de mecanismos que as defendem dos perigos do alumínio. As raízes de algumas delas excretam substâncias que precipitam esse mineral, tornando-o inofensivo. Outras o absorvem e o estocam, não o enviando à parte aérea da planta. Já as culturas comerciais, estranhas ao ecossistema em que são obrigadas a viver, normalmente não possuem esse sistema de defesa a não ser que ele tenha sido criado por geneticistas.
Além do cálcio, a raiz consome principalmente mais cinco “pratos”: nitrogênio, fósforo potássio, enxofre, boro. Como “sobremesa”, serve-se de magnésio, sódio, zinco, molibdênio, manganês e outros.
O nitrogênio encabeça a lista não sem razão: é “prato” raro de encontrar, especialmente quando mais plantas o exigem. Corre a crença de que ele impede o crescimento radicular. Nada disso. Acontece que o nitrogênio de adubo químico, colocado ao lado ou logo abaixo da linha de plantio, fica à disposição da raiz muito perto da superfície, de modo que ela não tem de procurá-lo e se acomoda, o que, aliás, lhe é fatal: na falta de chuvas ou de irrigação, as raízes, nesse caso curtas e superficiais, não têm meios de abastecer a planta com água suficiente. O capítulo final dessa pequena tragédia é óbvio: a planta morre. Na verdade, sem nitrogênio não há produção de aminoácidos, nem de proteínas, muito menos de enzimas e hormônios, o que compromete seriamente o desenvolvimento da planta. Os primeiros sinais de sua deficiência são notados pelo desenho em “V” que aparece nas folhas mais velhas (as da parte inferior da planta). Mais tarde, todas essas folhas amarelecem e a planta inteira assume a cor verde-claro.
No entanto, o amarelecimento não indica necessariamente a falta de nitrogênio. O fenômeno sucede sempre que, por algum motivo, não há formação de proteínas. Digamos que não tenha ar no solo. Nesse caso, a planta não tem forças para metabolizar o nitrogênio, mesmo que ele exista em grande quantidade. Surgem, então, sintomas de sua carência. Em solos adensados, o amarelecimento pode ser consequência da perda de nitrogênio, ou por ausência de oxigênio ou em razão de altas temperaturas.
E o fósforo? Há quem afirme que ele não influi no crescimento radicular. Mais um equívoco. A verdade é que a raiz, muitas vezes, mobiliza naturalmente a quantidade suficiente de fósforo para seu gasto, dispensando a aplicação de adubo fosfatado. É o caso do trigo-mourisco, feijão miúdo, puerária, tremoço, etc. O fato é que, sem fósforo, a planta não sobrevive, pois ele está intimamente ligado ao transporte de energia. Na sua falta as plantas apresentam cor verde-escuro, são estreitas, rígidas e eretas. As folhas mais velhas têm cor arroxeada e até os caules e veias podem descolorir para o purpúreo.
Já na ausência de enxofre as raízes são curtas, escuras, fibrosas e sua capacidade de absorção é mínima. Na primavera, as folhas dos brotos ficam amarelinhas, quase brancas, e a planta inteira toma esse aspecto, uma vez que não há mais formação de proteínas. Em árvores frutíferas observa-se a formação de galhos compridos, moles, que se curvam e não produzem.
A falta de boro é mais catastrófica pois é ele quem conduz os carboidratos sintetizados pela folha ao sistema radicular. Sem carboidratos não há energia, reservas, potencial de absorção – a fábrica para. Fica mesmo faltando quase tudo à raiz. E se falta tudo à raiz, faltará tudo à planta, que acaba morrendo.
Com pouco boro as raízes são desprovidas de amido, parecem aguadas e não cozinham (mandiocas e cenouras, por exemplo). Os caules são ocos e apodrecem facilmente (couve-flor e bananeira). Em muitas árvores os troncos são atacados por brocas; as frutas são pedrentas (goiabas e peras) ou apresentam manchas secas e marrons (maçãs e bananas). Em lavouras de milho despontam espigas múltiplas, saindo até quatro do mesmo lugar, todas estéreis. Os grãos, poucos, são pobres em amido. Por isso, afrouxam nos sabugos e caruncham ainda no campo.
O cobre é outro importante micronutriente, pois age no processo de respiração da planta. Sem ele a raiz é geralmente atacada pela podridão branca, doença causada por parasitas fatais. O cobre dosa também a quantidade de nitrogênio absorvida pela raiz, de modo que este parece estar em excesso na ausência daquele. Por falta de cobre os brotos murcham; em árvores, aparece uma excreção gomosa (caso dos pessegueiros); no trigo, as espigas são brancas e estéreis. E as raízes, muito prejudicadas, enfraquecem e diminuem o abastecimento da planta, que fica mais vulnerável ao ataque de pragas e doenças. Então, aplicam-se os agrotóxicos. Infelizmente.