Encontro de Mestres da Agroecologia

Material inédito, histórico – e único – de um grande encontro
Nossa homenagem a seu Yoshio Tsuzuki, a quem amamos profundamente.


OBS: Material com direito autoral. Reprodução sem os devidos créditos proibida.

Vídeo com legenda no Youtube.

Legendas: V- Virgínia. P: Primavesi. Y: Yoshio Tsuzuki

P: Se a terra tá boa, e a planta tá bem nutrida, não precisa nada, nada.

V: Aí eu perguntei quando foi que ele resolveu, e ele falou que acho que foi coisa de Deus, né? Como é?

Y: É, quer dizer, quer ver, eu ganhei muito com agrotóxico, vendas né?

P: Lá na Bayer?

Y: Na Bayer, ganhei muito ponto.

P: A Bayer é aqui para usar agrotóxico porque este trouxe, não?

Y: Mas depois, Dra, trabalhei 5 anos aí eu queria fazer receita de agrotóxico para cada cultura e cada praga/doenças. Porque só com produto Bayer é impossível isso, né? Igual remédio da gente, né? Remédio de uma fábrica não pode tratar tudo. Então, aí que queria fazer receita para doenças, pragas e (…) juntando o melhor produto dos vários fabricantes, Basf, Dupont, tudo isso, né? Aí pedi demissão e saí da Bayer e quando saí ele me deu o direito de distribuidor. No último ano, já tinha uma loja porque especificamente ele me falou: “olha, você continua sempre campeão então se você quer, eu autorizo, pode abrir uma loja para vender produto Bayer né? Eu abri e comecei a importar, naquele tempo usava muito produto de mercúrio, tratamento de semente, né? Depois desse aí abri 11 firmas para venda de agrotóxicos. (…) Em 1968, entrou café, ferrugem, para o Brasil. Então o governo o que fez? Obrigou a passar cobre no café contra a ferrugem, e não financiava. Poxa, vendi muito! Eu tinha 7.000 vendedores motorizados. Mais ou menos. Mas um ano, naquele tempo, eu já sentia: com veneno, agrotóxico, não vai defender finalmente doenças e pragas. Porque andando no campo, cada vez se aumenta inseto de resistência contra agrotóxico. Ácaro, acaricida, bom, inseticida não matava ácaro, várias pragas que não cobria isso. O que tinha também, muitas doenças não podia defender com fungicidas. E eu pensei: tá errado, eu tô andando no caminho errado. Vender agrotóxico e ganhar tanto dinheiro por um lado; liquidei todas as firmas. Aí comecei minha segunda vida.

P: Não, mas sabe que o problema da doença para mim é, eu tava indo pra trás, como é, e a planta é doente quando falta alguma coisa. Ela tá atacada porque, por exemplo, proteína não se forma, fica no meio caminho, então no meio caminho pode ser atacada, por isso tá atacada. No fim no fim, o que a gente precisa é uma terra bem agregada e uma raiz bem desenvolvida. O resto…

Y: É, primeiro, sem dúvida, fazer terra sadia, então raiz sadia automaticamente, planta sadia. Foi assim que aprendi.

P: É, é, claro!

Y: Não tem outra maneira. Não pode fugir.

P: Então, uma terra sadia é uma terra bem agregada, com vida.

Y: Eu escrevi esse material.

P: Se a terra tá boa, a gente enxerga primeiro já pela grumosidade e segundo, pelo cheiro. Terra boa cheira gostoso.

Y: Esse que eu fiz desde 1973, comprei chácara, até hoje isso. Hoje terra fraca, originalmente muito ruim, terra caulim, mas ela produz bem…

P: Bom, mas sabe que tanto faz se é caulim… É caulinita, é um tipo de terra pobre, não?

Y: Mas Doutora, caulinita no interior lá tá bom, mas quando sai aquele caulim branco para fazer cerâmica, puxa, isso é péssimo …(risos) . Quando comprei essa chácara, porque era terra plaina, boa pra fazer ensaio. Então comprei 7, 8 ha. Só um hectare que era inclinado, o resto tudo plaina. Mas não sabia que embaixo era caulinita.

P: Não, claro, porque se a terra tá pobre, dá mais possibilidade de doença, não?

Y: Então primeiro para experimentar plantei milho, usei agroquímico um pouco. Não pereceu, desse tamanho, mesmo adubando bem, adubo químico 4:4:1 junto, né, aquele tempo, a (…) não produzi nada! Aí comecei com esterco de galinha. Puxa! Com esterco de galinha cresceu bem. Aí comecei… essa granja que comprei tinha galinheiro, tinha galinha, criava galinha, e entrou (…) e vendeu, aí comprei. É sorte isso! Comecei 13 mil galinhas.

V: No sistema Yamaguishi, né?

Y: Não, o sistema Yamaguishi dois anos depois. Primeiro é convencional. Mas se fazia com capim, colocava capim no chão, não é, quatro cabeças de galinha poedeira em cima, fazia composto. Esse foi o fundamental nesse tempo, não comprei nenhum quilo de nenhum adubo orgânico, só produzia, com 13 mil galinhas.

P: É, mas sabe que o grande problema que eu enxergo que em grande escala não dá para plantar deste jeito.

Y: Não dá.

V: E ai, como é que faz?

P: Pois é, ai tá, como se faz?

Y: Bom, melhor é, meu jeito, é adubo verde. Coisa melhor benefício.

V: Pode ser a adubação verde uma solução?

Y: No momento seria a expansão do adubo verde e intercalar, né?

P: Tem de fazer a rotação de culturas.

Y: Isso, rotação de cultura com adubação verde. Ainda, verdura também, mesma coisa. Só verdura, verdura, acaba a terra. Tem que intercalar, cada 2 anos, 3 anos, em cereais e gramíneas.

P: É, tem de fazer uma rotação e aí funciona.

Y: É, esse fato é fundamental. E isso todo mundo…não sei se aqui no Brasil…no Japão ensinavam né…

P: Bom, no Japão tá…

Y: Aqui também, né?

P: É.

Y: Também ensina isso, né?

P: É.

Y: Ciência do solo. Como fazer solos sadios, isso é a escola que ensina.

P: Mas no Japão eles têm propriedades que têm 400m2, não?

Y: 0,8 hectares. Cada família.

V: Então, talvez estivesse aí a solução do problema, né? Talvez não ter propriedades tão grandes como temos aqui no Brasil. Ter propriedades menores, e aí melhoraria até a vida social dessas pessoas que não têm trabalho…

P: Mas na China tá pior ainda…

Y: Aqui também… eu fui chamado num assentamento no interior. Só a promissão tem 20.000 ha de assentamento. O governo deu pra todo mundo 5 a 8 alqueires gratuitamente.

P: Alqueires?

Y: Não presta, não vale nada!

P: Ah não?

Y: É, mas agora o governo financia para eles, próprios lavradores, o que fazia ganhando 5 a 8 alqueires? Põe pouca cabeça de gado e trabalha na cidade. Não estava produzindo. Agora o governo começou a apertar um pouco para produzir. Financiando o dinheiro…bom, e me chamaram para plantar…bom, verdura é área pequena, rende bem né? Então começa com verduras como feirante. Ô Doutora, interessante: eu comecei a andar um ano para cá no interior de São Paulo. Alta Paulista, no oeste, Sorocabana né, antigamente não sei se tinha colonião. Famílias italianas, descendentes. E têm em média 5 a 10 alqueires de terra. Justamente fazendo agricultura familiar.

P: Mas agora não tá mais porque o governo destruiu tudo.

Y: Mas pra mim, isso é mais seguro do que grandes. Quer ver? Eu ando no norte do Paraná também e no norte do Paraná cerealista que planta 500 alqueires cada um, grandes têm 500 alqueires. Cem alqueires já é, não é fazenda, 100 hectares. Então todo mundo tem dívida muito grande para o banco. Grandes produtores de cereais.

P: Ah, claro, porque …

V: E por quê?

Y: Bom, isso aqui, você pode ver: antigamente, ninguém tinha dívidas.

P: O grande problema, sabe, é para mim o seguinte, que o pessoal, antigamente o adubo era pequeno, não adubaram muito, não, era tudo bom, agora hoje em dia, produto agrícola não vale mais nada e o adubo custa uma imensidão, então a gente continua com isso e aí tá cada dia pior.

Y: Isto sistematicamente acabando lavouras de cerealista. Minha opinião, a maior causa é herbicida, a Monsanto.

V: O maior o quê?

Y: O glifosato.

V: Todo mundo usa?

Y: Todo mundo usa. Acaba a terra…

V: Glifosato é o Roundup?

Y: É.

P: Glifosato é o Roundup

Y: No Roundup as plantas não produzem 3 aminoácidos, não produzem mais, por causa disso mata, morre o capim. Ervas daninhas… Anteontem eu falava com um médico que se dedica a essa área, né, ele falou associação de medicina, médicos, e brasileira, antes de entrar o Roundup, foi contra. Isso aqui acaba com a saúde da gente.

P: Não, mas não só a saúde da gente, mas também lá no Nordeste, eles acho que usam 7, 8 anos o Roundup, não cresce mais nada, tá deserto. Não tem mais nada.

V: Mas se aí se já usa o Roudup e não produz mais os 3 aminoácidos, os 3 aminoácidos não fazem falta na planta?

Y: Ah, bom, isso é que eu acho, quer ver, nos Estados Unidos, a semente (…) parece uma substância dentro de Roundup né, fica na terra, lógico transforma isso também, na terra. Então em Estados Unidos, já alguns grupos de cientistas descobriu que o Roudup faz muito mal para a saúde da gente. Eles começam juntando uma associação de médicos brasileiros discutir com Ministério de Saúde, Ministério de Agricultura para não entrar o Roundup. Mas o que fez o Ministério da Agricultura. Ele pôs o limite da substância tóxica sempre a mais para autorizar a entrada de Roundup. Mudou a lei!

V: Mudou a lei. Porque a Monsanto é muito influente. E ela consegue o que ela quer.

P: Não, mas claro!

Y: Esse glifosato,(…) Onde faz herbicida no pomar, (…) aparece muita doença, muita praga. Terra fica compactada.